Tema 2


Abordagem comunicativa das relações interpessoais:  Interaccionismo Simbólico;  Escola de Palo Alto

As contribuições do Interacionismo Simbólico e da Escola Palo Alto para a compreensão da comunicação social resumem-se em considerar a mesma como a base da interacção social e assim sendo como fundamental para a construção do mundo social. Defendem os autores de ambas as abordagens que sem comunicação não é possível falar de sociedade. A cultura e aprendizagem acontecem a partir da comunicação, ou interacção simbólica, através da qual cada ser humano constrói a sua própria identidade. O self (Mead, 1934) ou o “looking-glass self” (Charles Cooley), traduzem a construção de um eu a partir da interacção com os outros. Assim, de acordo com George H. Mead vamos construindo o nosso sentido de “eu” de um modo simétrico ao nosso sentido da existência do outro (reflections in a looking glass). Cada um de nós adquire a consciência de um outro generalizado, a sociedade. Cada situação de interacção define-se de acordo com a bagagem simbólica de cada um que projectamos para a situação de interacção em que nos encontremos. É através da interacção simbólica – a comunicação- que se realiza todo o processo de socialização.
“Lo interesante de las aportaciones del Interaccionismo Simbólico y la Escuela de Palo Alto es que ponen en evidencia la importancia de retomar y de hacer observable la comunicación atendiendo a su significado originario: la puesta en común, el diálogo, la comunión” (Marta Rizo 2004:15).
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O Interacionismo Simbólico pensado por Herbert Blumer, é o processo de interação na formação de significados pelos indivíduos. Blumer era um devoto de George H.Mead, e foi influenciado por John Dewey. Dewey defendia que os seres humanos são melhor entendidos na sua relação com o ambiente, o que serviu de inspiração a Herbert Blumer. Segundo Blumer, a própria expressão “interação simbólica” refere-se ao caráter peculiar e distintivo da interação, como ela acontece entre os seres humanos. A particularidade da interação humana advém do fato de que os seres humanos interpretam as ações uns dos outros ao invés de apenas reagir a essas ações. 
Blumer identificou três princípios fundamentais do interacionismo simbólico que lidam com:

Significado  – os seres humanos agem em relação às pessoas ou coisas com base nos significados que atribuem a essas pessoas ou coisas.
Linguagem  – o significado surge da interação social que as pessoas têm umas com as outras, ou seja, não é inerente a objetos, não é preexistente na natureza. O significado é negociado por meio do uso da linguagem – daí o termo interaccionismo simbólico.
Pensamento  – a interpretação de um indivíduo dos símbolos é modificada pelos seus próprios processos de pensamento. Os Interaccionistas simbólicos descrevem o pensamento como uma “conversa interna”.
Mead chamou a este diálogo interno minding.

 Estes princípios fundamentais ajudam a perceber o self e o processo de socialização numa comunidade maior.

A propósito de George Herbert Mead e da obra Mind, Self and Society que reúne os seus pensamentos (coligidos pelos seus alunos, após a sua morte), Gil (2000) considera, que o autor assumia o próprio estudo do pensamento associado ao estudo da linguagem, sustentados pela relação entre a conduta, o pensamento (como discurso interior levado a cabo face a elementos exteriores) e a linguagem que utilizamos. Assim, Mead parte da percepção de Wundt da existência de um «paralelismo entre o que ocorre no corpo e o que sucede nas próprias experiências». A partir do exemplo da reciprocidade do comportamento dos cães e da esgrima ou pugilismo, apercebera-se Wundt que um gesto serve de estímulo para outras formas de actos. Há uma adaptação instintiva à atitude do outro, num peculiar jogo recíproco que leva os gestos a executarem funções, e assim a provocarem reacções nos outros, funcionando como estímulos para uma readaptação.

Refere Griffin (2009:60) que a designação do termo interaccionismo simbólico captura a atividade mais humana e humanizadora que as pessoas podem exercer - falar umas com as outras (what Mead claimed is the most human and humanizing activity that people can engage in – talking to each other).

Wundt afirmava que não era possível estudar os processos mentais mais profundos de maneira experimental. Para Wundt a psicologia era uma ciência intermediária entre as ciências da natureza e as ciências da cultura. Por meio da análise dos fenómenos culturais, segundo Wundt, manifestam-se os processos superiores da vida mental – como o pensamento, a imaginação, etc. (http://artigos.psicologado.com/psicologia-geral/historia-da-psicologia/wundt-e-a-criacao-do-primeiro-laboratorio-de-psicologia-na-alemanha)


Na perspectiva do interaccionismo simbólico, é numa relação que se constrói o processo, o que implica, também, o não dito, o não verbal, a linguagem corporal e simbólica e uma contínua interpretação dos sinais dos outros e daquilo que eles devolvem como espelho e reflexo do que somos (Barros, 2010:73).

Este vídeo  ajuda a  compreender melhor o conceito de interaccionismo simbólico:



Interaccionismo Simbólico

Princípios básicos
Exemplos práticos

Para Blumer a natureza do interacionismo simbólico assenta em três premissas:

Significado – Os seres humanos agem perante outros indivíduos ou coisas de acordo com o significado ou significados que as coisas têm para eles. Tais coisas incluem tudo que o ser humano possa notar no seu mundo de objetos físicos, tais como árvores ou cadeiras; outros seres humanos, tais como uma mãe ou uma balconista de loja; categorias de seres humanos, tais como amigos ou inimigos; instituições, como uma escola ou um governo; ideais guiam, tais como independência individual ou honestidade; atividades de outros, tais como seus comandos ou pedidos; e situações como um encontro individual na sua vida diária.O
significado que tudo isso tem para o indivíduo influencia a formação do comportamento, e conhecê-lo é o que pode nos levar a compreender a ação humana.

Linguagem O significado de tais coisas é derivado ou é construído a partir dos processos de interação social que os homens estabelecem uns com os outros. Por outras palavras, os significados são produtos sociais que surgem da interação. A linguagem é um vasto sistema de símbolos. As palavras são símbolos porque são utilizadas para significar coisas e tornam possível todos os restantes signos. Os actos, os objectos e as palavras existem e têm significado apenas porque foram ou podem ser descritas através de palavras.

Pensamento – Os significados são manipulados, e modificados através de um processo interpretativo usado pelos indivíduos ao lidar com as coisas e podem sofrer mudanças ao longo do tempo.

Estes princípios fundamentais  ajudam a perceber o self e o processo  de socialização numa comunidade maior.  

O self tem a capacidade única de ser tanto sujeito como objeto, e pressupõe um processo social: a comunicação entre seres humanos. O mecanismo geral para o desenvolvimento geral para o desenvolvimento do self é a reflexão, ou a capacidade de nos colocarmos inconscientemente no lugar dos outros. É através da reflexão que o processo social é internalizado na experiência das pessoas nele envolvidas.  O self é um processo dialético com o “Eu” convocando o “Mim” e então respondendo a ele. – “If the «I» speaks, the «Me» hears”. The «I» of this moment is present in the «Me» of the next moment”

Uma sala de aula é um “grande palco” onde alunos e professores desempenham papéis diferentes mas em interacção
 Através de linguagem, e expressões em geral, o professor apresenta
— o que quer ser / o que deseja que o aluno perceba;
— como vê o aluno / o que espera que o aluno seja;
— se não for como deseja, farei... etc.

É na sala de aula que em processos de interacção o professor “negoceia” significados para determinadas coisas que na individualidade de cada um podem ter diversos sentidos.  Vygotsky defende que é na interação entre as pessoas que em primeiro lugar se constrói o conhecimento que depois será intrapessoal, ou seja, será partilhado pelo grupo junto ao qual tal conhecimento foi conquistado ou construído.
Na sala de aula o desenvolvimento produz-se não apenas por meio da soma de experiências, mas, e sobretudo, nas vivências das diferenças. O aluno aprende imitando, concordando, fazendo oposição, estabelecendo analogias, internalizando símbolos e significados, tudo isto num ambiente social.

Numa aula de matemática tentava negociar critérios de avaliação. Procurava que os alunos percebessem como era importante e seria valorizado o modo como deveriam explicar os seus raciocínios na realização das tarefas. Foi acordado que em algumas situações aos alunos que apresentassem a melhor explicação/argumentação seria atribuída uma prenda. Foi interessante ver o significado de prenda para cada um dos alunos da turma. Para uns valeria a pena o esforço se fosse por exemplo um leitor de mp3, um telemóvel, um netbook…para outros um caderno, uma esferográfica uma ida ao MacDonalds. Estava-se em presença de alunos de condições socioeconómicas distintas para os quais o significado de prenda tinha representações diferentes.







































   

Nos anos 50, desenvolve-se nos Estados Unidos, sobretudo em torno de Gregory Bateson e da escola de Palo Alto, uma corrente chamada "antropologia da comunicação", que toma em linha de conta tanto a comunicação não-verbal como a comunicação verbal entre os indivíduos. A comunicação não é concebida como uma relação de emissor-receptor, mas segundo um modelo orquestral, ou, por outras palavras, como resultando de um conjunto de indivíduos que se reúnem para tocar juntos e se acham numa situação de interacção duradoura. Todos participam solidariamente, mas cada um à sua maneira, na execução de uma partitura invisível – a partitura, quer dizer, a cultura, só existe através do desempenho interactivo dos indivíduos. 

Na Teoria da comunicação da Escola de Palo Alto, a comunicação é um processo criativo complexo, e é muito mais que um processo linear de transmissão de uma mensagem de um emissor para um receptor, pois as interações sociais são marcadas pela complexidade constitutiva dos actores sociais.

Escola de Palo Alto

Princípios básicos
Exemplos práticos

- Qualquer conduta numa situação de interacção tem um valor de mensagem e, assim, não se pode não comunicar ou não se pode não influenciar;

- Qualquer comunicação tem um conteúdo e um aspecto relacional, sendo que o conteúdo é determinado pela interacção que se estabelece pelos interlocutores. É nesta interrelação que se estabelece a intenção comunicativa da mensagem, ou seja, a interpretação da mesma. Em suma, na interacção estabelece-se a metacomunicação;

- Num processo de interacção, os participantes vão estabelecendo as sequências dos factos à sua maneira, isto é, na interacção o indivíduo não só provoca atitudes como reage a elas;

- Todas as interacções comunicacionais são simétricas ou complementares com base na igualdade ou na diferença, respectivamente. Assim, podemos concluir que na comunicação há relações de poder, de controlo e de estatuto.

- A Comunicação pode ser analógica ou digital. (D. Bougnoux faz corresponder a comunicação ao universo analógico da enunciação, da relação, do uso dos índices e ícones; e a informação ao universo digital dos enunciados, dos conteúdos, do uso dos símbolos, tanto linguísticos quanto numéricos. Assim, quando usamos um símbolo (comunicação analógica) para referir uma realidade, a relação entre esse símbolo e o seu referente é analógica; quando usamos um signo linguístico (comunicação digital) para referir uma realidade, a relação entre a palavra e o seu referente é arbitrária.


Dado que uma interacção simétrica se baseia numa relação de igualdade de poder enquanto uma interacção complementar se baseia em diferenças de poder poderemos afirmar que as relações interpessoais e comunicacionais que acontecem num departamento curricular entre professor e relator possuem os dois tipos de comunicação – a simétrica e a complementar.

Em ambiente de sala de aula a comunicação verbal ganha, por vezes mais significado quando acompanhada pela não-verbal, facilitando a meta comunicação

A comunicação digital é importante na troca de informação sobre os objectos com vista à transmissão do conhecimento

a comunicação analógica é mais eficaz para assinalar intenções e indicações de humor e para, definir a natureza das relações. Em ambiente de sala de aula ocorre comunicação não verbal (analógica) que se traduz em movimentos corporais, mímica, inflexões da voz, diferentes ritmos e entoações de palavras etc.




A comunicação
Observa Perraudeau (1996: 96) que a comunicação, tal como a desenvolveram Watzlawick e os seus colaboradores de Palo Alto, obedece a um determinado número de princípios:

o primeiro, o mais determinante, é formulado através de uma dupla negação: não se pode não comunicar. Comunicar é entendido a diversos níveis: a dimensão sintáxica e lógica traduz-se, essencialmente, na verbalização;  a dimensão semântica diz respeito à compreensão; a dimensão pragmática ou comportamental é relativa à acção.

o segundo princípio postula que a comunicação se efectua em dois modos: comunicação digital é importante em sintaxe, em lógica e exprime-se por palavras. A comunicação analógica decorre do não-verbal, é o aspecto comportamental. Todos conhecem alunos que desenvolvem uma conduta particular, podendo revelar-se incómoda, mas significando à sua maneira que eles têm qualquer coisa a dizer. A observação põe igualmente m evidência o facto de alguns alunos dizerem «sim» digitalmente e «não» analogicamente. Contradição que é preciso ter em mente para ajudar os alunos a ultrapassá-la.

o terceiro princípio, que interessa directamente ao professor, diz respeito aos tipos de comunicação. Dois são importantes: o que se baseia no reconhecimento e o que se baseia na indiferença. A relação de reconhecimento entre dois parceiros pode ser contratual ou conflitual. Nos dois termos desta alternativa, cada um existe porque reconhece a existência do outro, seja para o aprovar, seja para o contestar. A relação de indiferença entre as partes resulta, pelo contrário, na negação do outro. Os interlocutores falam, mas não se ouvem. Não há existência, porque não há reconhecimento. A situação pode revestir-se de um carácter aparentemente tolerável, é a indiferença mais comum: um fala, o outro não ouve, no entanto, o primeiro prossegue, agindo como se fosse ouvido. A situação pode tomar-se intolerável com a oposição activa de uns ao discurso dos outros. É a situação vivida em determinadas aulas, podendo os professores procurar soluções nas condutas de fuga. 

Não há «não-comportamento»
Admitamos, antes de mais, que o comportamento possui uma propriedade do mais fundamental e que, como tal, escapa frequentemente à atenção: o comportamento não tem um contrário. Por outras palavras, não há «não-comportamento», ou para expor as coisas de forma ainda mais simples: não se pode não ter comportamento. Ora, se se admite que, numa interacção, todo o comportamento tem o valor de uma mensagem, ou seja, que ele é uma comunicação, segue-se que , não é possível não comunicar, quer se queira quer não. Actividade ou inactividade, palavra ou silêncio, tudo tem valor de mensagem tais comportamentos influenciam os outros e os , outros, por seu lado, não podem não reagir a estas comunicações e, como tal, comunicarem eles próprios. É preciso compreender claramente que o simples facto de não falar ou de não, prestar atenção ao outro, não constitui uma excepção ao que acabámos de dizer. Um homem sentado à mesa de um bar cheio de gente e que olha em frente diante de si, um passageiro que, num avião, permanece sentado no seu lugar com os olhos fechados, comunicam ambos uma mensagem: eles não querem falar com ninguém e não querem que ninguém lhes dirija a palavra; em geral, os seus vizinhos «compreendem a mensagem» e reagem, deixando-os tranquilos. Há aqui, manifestamente, um intercâmbio de comunicação, tanto como numa animada discussão.
 PAUL WATZLAWICK et al, Une logique de la communication, pp. 45-46. 



Referências bibliográficas

Barros, N. (2010). Violência nas escolas.Bullying.Lisboa: Bertrand Editores.
Cuche, D. (2004). A noção de cultura nas ciências sociais. Lisboa: Fim de Século.
Gonçalves, C. (2003). Escola e família: uma relação necessária e conflitual. In Costa, M (Org.),Gestão de conflitos na escola (pp. 99-142). Lisboa: Universidade Aberta.
Griffin, E. (2009). A first look at communication theory. Singapore:McGraw-Hill
Rizo, M (2004). El interaccionismo simbólico y la Escuela de Palo Alto. Hacia un nuevo concepto de comunicación. Razón y Palabra, 40, 1-20. Recuperado em 10 abril, 2011, http://www.portalcomunicacion.com/lecciones_det.asp?id=17
Perraudeau, M. (1996). Os métodos cognitivos em educação. Aprender de outra forma na escola. Lisboa:Instituto Piaget.
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